terça-feira, 19 de março de 2013

Maria, a Arca da Nova Aliança


Elogiar Maria como Arca da Aliança evoca toda a tradição bíblica


Esta é, com certeza, uma das mais belas e populares invocações da Ladainha de Nossa Senhora. A densidade simbólica dessa invocação não cabe em poucas linhas. Sabemos da importância que tinha a Arca da Aliança no Antigo Testamento. Dentro dela estavam as Tábuas da Lei, recebidas por Moisés no Monte Sinai como sinal da Aliança entre Deus e Seu povo. Essa Arca era a expressão visível de que Javé estava no meio do povo. Não era um Deus distante e solitário. É um Deus próximo e solidário. 

Durante o tempo em que durou a travessia do deserto, o povo caminhava com o estandarte da presença do Senhor. Para a Arca havia uma tenda especial. Ali aconteciam as reuniões dos líderes, nessa tenda se tomavam as grandes decisões. Era também um lugar de encontro com o Altíssimo. Quando o povo de Deus atravessou o Rio Jordão, sob o comando de Josué, a Arca ia à frente, carregada por sacerdotes. O Rei Davi construiu um espaço sagrado especial para ela [Arca]. A Bíblia conta com ricos detalhes a festa que foi feita para levar a Arca em procissão para o seu lugar de destaque (cf. 1Cr 15). Houve naquele dia muita música e danças para celebrar a memória da presença de Deus no meio do Seu povo. O grande Templo de Jerusalém, construído por Salomão, foi para conter a Arca da Aliança.

No Novo Testamento a Arca da Aliança aparece no testemunho final de Estêvão, o primeiro mártir cristão. Ele faz uma significativa memória crítica: “A Arca da Aliança esteve com os nossos pais no deserto, como Deus ordenou a Moisés que a fizesse conforme o modelo que tinha visto. Recebendo-a nossos pais, levaram-na sob a direção de Josué às terras dos pagãos, que Deus expulsou da presença de nossos pais. E ali ficou até o tempo de Davi. Este encontrou graça diante de Deus e pediu que pudesse achar uma morada para o Deus de Jacó. Salomão foi quem lhe edificou a casa.

O Altíssimo, porém, não habita em casas construídas por mãos humanas. Como diz o profeta: ‘O céu é o meu trono, e a terra o escabelo dos meus pés. Que casa me edificareis vós?, diz o Senhor. Qual é o lugar do meu repouso? Acaso não foi minha mão que fez tudo isto (Is 66,1s.)?’ Homens de dura cerviz, e de corações e ouvidos incircuncisos! Vós sempre resistis ao Espírito Santo. Como procederam os vossos pais, assim procedeis vós também!” (At 7,44-51).


Portanto, já para os primeiros cristãos, as Tábuas de Pedra eram insuficientes, pois eles haviam conhecido, em Jesus, uma Nova Aliança de amor, feita de um coração manso e humilde. A verdadeira Arca da Aliança não estava mais no Templo de Jerusalém, pois todo batizado se tornara um templo onde habita Deus. Maria foi a primeira cristã; a primeira Arca da Aliança de carne! Mas todos nós, de certa forma, seguimos na mesma direção. 

Somos “contemplados” com essa graça, ou seja, o Espírito Santo nos transforma em “templos vivos”. Somos o corpo de Cristo, a Igreja. Somos pedras vivas dessa edificação.

Elogiar Maria como “Arca da Aliança” evoca toda esta longa tradição bíblica. Mas é também algo muito atual. O Verbo se fez carne e “armou entre nós a Sua tenda”, como afirma João no prólogo do seu Evangelho. Assim como no deserto havia a “tenda da reunião”, que caminhava com a itinerância do povo, também hoje, por onde vão os passos de um batizado caminha a Arca Santa de Deus. Levamos esta marca em nosso coração. Somos missionários. Ficamos maravilhados quando o Santíssimo Sacramento passa em procissão no meio do povo. É bonito mesmo! Mas cada um de nós é muito mais do que aquele Ostensório que abriga a Hóstia Consagrada. Somos Hóstias Vivas, consagradas em corpo e sangue de Jesus. Somos povo santo! Tudo isso pode vir à nossa memória e ao nosso coração quando rezamos: Arca da Aliança, rogai por nós!

Pe. Joaozinho

segunda-feira, 18 de março de 2013

O purgatório na Bíblia



Muitos me perguntam onde está na Bíblia o Purgatório? Ele é uma exigência da razão e mesmo da caridade de Deus por nós. A palavra “Purgatório” não existe na Bíblia, foi criada pela Igreja, mas a realidade, o “conceito doutrinário” deste estado de purificação existe amplamente na Sagrada Escritura como vamos ver. A Igreja não tem dúvida desta realidade por isso, desde o primeiro século reza pelo sufrágio das almas do Purgatório. 


1 - São Gregório Magno (†604), Papa e doutor da Igreja, explicava o Purgatório a partir de uma palavra de Jesus: “No que concerne a certas faltas leves, deve-se crer que existe antes do juízo um fogo purificador, segundo o que afirma aquele que é a Verdade, dizendo que se alguém tiver pronunciado uma blasfêmia contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado nem no presente século nem no século futuro (Mt 12,31). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas no século presente, ao passo que outras, no século futuro” (Dial. 41,3). O pecado contra o Espírito Santo, ou seja a pessoa que recusa de todas as maneiras os caminhos da salvação, não será perdoado nem neste mundo, nem no mundo futuro. Mostra o Senhor Jesus, então, neste trecho, implicitamente, que há pecados que serão perdoados no mundo futuro, após a morte.

2 - O ensinamento sobre o Purgatório tem raízes já na crença dos próprios judeus do Antigo Testamento; cerca de 200 anos antes de Cristo, quando ocorreu o episódio de Judas Macabeus. Narra-se aí que alguns soldados judeus foram encontrados mortos num campo de batalha, tendo debaixo de suas roupas alguns objetos consagrados aos ídolos, o que era proibido pela Lei de Moisés. Então Judas Macabeus mandou fazer uma coleta para que fosse oferecido em Jerusalém um sacrifício pelos pecados desses soldados. “Então encontraram debaixo da túnica de cada um dos mortos objetos consagrados aos ídolos de Jâmnia, coisas proibidas pela Lei dos judeus. Ficou assim evidente a todos que haviam tombado por aquele motivos… puseram-me em oração, implorando que o pecado cometido encontrasse completo perdão… Depois [Judas] ajuntou, numa coleta individual, cerca de duas mil dracmas de prata, que enviou a Jerusalém para que se oferecesse um sacrifício propiciatório. Com ação tão bela e nobre ele tinha em consideração a ressurreição, porque, se não cresse na ressurreição dos mortos, teria sido coisa supérflua e vã orar pelos defuntos. Além disso, considerava a magnífica recompensa que está reservada àqueles que adormecem com sentimentos de piedade. Santo e pio pensamento! Por isso, mandou oferecer o sacrifício expiatório, para que os mortos fossem absolvidos do pecado” (2Mc 12,39-45). 


O autor sagrado, inspirado pelo Espírito Santo, louva a ação de Judas: “Se ele não esperasse que os mortos que haviam sucumbido iriam ressuscitar, seria supérfluo e tolo rezar pelos mortos. Mas, se considerasse que uma belíssima recompensa está reservada para os que adormeceram piedosamente, então era santo e piedoso o seu modo de pensar. Eis porque ele mandou oferecer esse sacrifício expiatório pelos que haviam morrido, afim de que fossem absolvidos do seu pecado”. (2 Mac 12,44s) .Neste caso, vemos pessoas que morreram na amizade de Deus, mas com uma incoerência, que não foi a negação da fé, já que estavam combatendo no exército do povo de Deus contra os inimigos da fé. Cometeram uma falta que não foi mortal.

Fica claro no texto de Macabeus que os judeus oravam pelos seus mortos e por eles ofereciam sacrifícios, e que os sacerdotes hebreus já naquele tempo aceitavam e ofereciam sacrifícios em expiação dos pecados dos falecidos e que esta prática estava apoiada sobre a crença na ressurreição dos mortos. E como o livro dos Macabeus pertence ao cânon dos livros inspirados, aqui também está uma base bíblica para a crença no Purgatório e para a oração em favor dos mortos.

3 - Com base nos ensinamentos de São Paulo, a Igreja entendeu também a realidade do Purgatório. Em 1Cor 3,10, ele fala de pessoas que construíram sobre o fundamento que é Jesus Cristo, utilizando uns, material precioso, resistente ao fogo (ouro, prata, pedras preciosas) e, outros, materiais que não resistem ao fogo (palha, madeira). São todos fiéis a Cristo, mas uns com muito zelo e fervor, e outros com tibieza e relutância. E S. Paulo apresenta o juízo de Deus sob a imagem do fogo a provar as obras de cada um. Se a obra resistir, o seu autor “receberá uma recompensa”; mas, se não resistir, o seu autor “sofrerá detrimento”, isto é, uma pena; que não será a condenação; pois o texto diz explicitamente que o trabalhador “se salvará, mas como que através do fogo”, isto é, com sofrimentos. 

4 - Na passagem de Mc 3,29, também há uma imagem nítida do Purgatório:”Mas, se o tal administrador imaginar consigo: ‘Meu senhor tardará a vir’. E começar a espancar os servos e as servas, a comer, a beber e a embriagar-se, o senhor daquele servo virá no dia em que não o esperar (…) e o mandará ao destino dos infiéis. O servo que, apesar de conhecer a vontade de seu senhor, nada preparou e lhe desobedeceu será açoitado com numerosos golpes. Mas aquele que, ignorando a vontade de seu senhor, fizer coisas repreensíveis será açoitado com poucos golpes.” (Lc 12,45-48). É uma referência clara ao que a Igreja chama de Purgatório. Após a morte, portanto, há um “estado” onde os “pouco fiéis” haverão de ser purificados.

5 - Outra passagem bíblica que dá margem a pensar no Purgatório é a de (Lc 12,58-59): “Ora, quando fores com o teu adversário ao magistrado, faze o possível para entrar em acordo com ele pelo caminho, a fim de que ele não te arraste ao juiz, e o juiz te entregue ao executor, e o executor te ponha na prisão. Digo-te: não sairás dali, até pagares o último centavo.”

O Senhor Jesus ensina que devemos sempre entrar “em acordo” com o próximo, pois caso contrário, ao fim da vida seremos entregues ao juiz (Deus), nos colocará na “prisão” (Purgatório); dali não sairemos até termos pago à justiça divina toda nossa dívida, “até o último centavo”. Mas um dia haveremos de sair. A condenação neste caso não é eterna. A mesma parábola está´ em Mt 5, 22-26: “Assume logo uma atitude reconciliadora com o teu adversário, enquanto estás a caminho, para não acontecer que o adversário te entregue ao juiz e o juiz ao oficial de justiça e, assim, sejas lançado na prisão. Em verdade te digo: dali não sairás, enquanto não pagares o último centavo” . A chave deste ensinamento se encontra na conclusão deste discurso de Jesus: “serás lançado na prisão”, e dali não se sai “enquanto não pagar o último centavo”.

6 - A Passagem de São Pedro 1Pe 3,18-19; 4,6, indica-nos também a realidade do Purgatório:”Pois também Cristo morreu uma vez pelos nossos pecados (…) padeceu a morte em sua carne, mas foi vivificado quanto ao espírito. É neste mesmo espírito que ele foi pregar aos espíritos que eram detidos na prisão, aqueles que outrora, nos dias de Noé, tinham sido rebeldes (…).” Nesta “prisão” ou “limbo” dos antepassados, onde os espíritos dos antigos estavam presos, e onde Jesus Cristo foi pregar durante o Sábado Santo, a Igreja viu uma figura do Purgatório. O texto indica que Cristo foi pregar “àqueles que outrora, nos dias de Noé, tinham sido rebeldes”. Temos, portanto, um “estado” onde as almas dos antepassados aguardavam a salvação. Não é um lugar de tormento eterno, mas também não é um lugar de alegria eterna na presença de Deus, não é o céu. È um “lugar” onde os espíritos aguardavam a salvação e purificação comunicada pelo próprio Cristo.

Texto: Prof. Felipe Aquino

terça-feira, 12 de março de 2013

O celibato e a Ordenação Sacerdotal



O sacerdote é chamado a ser um “alter christus”, um outro Cristo. Ele vive somente para o Reino de Deus. 

O Papa Emérito Bento XVI, assim como o Beato João Paulo II explicaram por várias vezes porque um sacerdote não se casa. É por apenas um único motivo: para que ele seja inteiramente de Deus, inteiramente livre para o povo de Deus. 


Se o sacerdote tiver esposa, tiver filhos a sua vida fica dividida e ele não pode servir ao Reino de Deus com toda sua força, com toda a sua integralidade. Não é porque o sacramento do matrimônio seja menos importante, não. É porque o sacerdote é um "outro Cristo" , que entrega sua vida para Cristo definitivamente. 

E a prova de que um rapaz que tem de fato vocação para o sacerdócio é a disposição dele de vencer o sacerdócio, e o Cristo valorizou isto. No evangelho de São Mateus, capítulo 19, Jesus fala daqueles que se tornaram eunucos (aquele que não pode gerar) porque foram castrados. Mas Jesus disse que outros se tornaram eunucos por amor ao Reino de Deus. É o caso do sacerdote, que não gera, não casa, não tem filhos por amor do Reino de Deus. E São Paulo elogiou também, dizendo: "Sejam como eu, solteiro, não se casem."  

São Nunca, o padroeiro das mulheres de batina 


Alguns questionamentos me chamaram a atenção para este tema: a ordenação sacerdotal de mulheres. O primeiro questionamento foi este: “Jesus só escolheu apóstolos homens é verdade, mas fez isso por causa do contexto social da época.”

E desde quando Jesus dava bola pra convenções? Nos Evangelhos, vemos a Sua pouca reverência às normas pseudo-religiosas e sociais: sentava-se à mesa com prostitutas e “impuros” em geral, curava aos sábados e xingava aqueles que se diziam mestres da religião. Não tendo a menor preocupação em ser popular, espantou muitos discípulos, chocados com suas palavras.

Pois bem, Jesus tinha numerosas seguidoras, entre elas, Maria, Sua Mãe de incomparável honra e santidade. Mas não deu a autoridade dos Apóstolos a nenhuma delas!  Se Ele quisesse fazer isso, alguém acha que a opinião da sociedade o impediria?

Homens e mulheres são iguais diante de Deus. Portanto, não há qualquer motivo razoável que impeça o acesso das mulheres ao sacerdócio.”

Como bem diz São Paulo, “Já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, pois todos vós sois um em Cristo Jesus” (Gal 3:28). De fato, a dignidade dos homens e mulheres é idêntica. Porém, estes dois sexos não são tão diferentes à toa, tanto na constituição física quanto psicológica.

Homens são de Marte e mulheres são de Vênus! E esta diversidade se reflete na sua relação com os demais, com o trabalho, com a família, com a comunidade cristã e com Deus.

Cristo era homem, e isso não foi por acaso: a sua masculinidade refletia a identidade masculina do Criador, que se revelou como Pai, e não como Mãe. Por isso, tantas vezes o Nazareno referiu-se a si mesmo como o Filho do Homem.

Também os Apóstolos formavam um “Clube do Bolinha”, não por acidente. Afinal, o sacerdote, imagem de Cristo, tem a Igreja por sua Esposa (é assim que a Bíblia chama a Igreja: “Esposa de Cristo”). Como uma mulher sacerdotiza poderia ter esta mesma relação “matrimonial” com a Igreja? A masculinidade é, portanto, condição fundamental para que uma pessoa possa representar o Filho de Deus na Terra, exercendo as mesmas funções que Ele exercia.

“…o fato de Maria Santíssima (…) não ter recebido a missão própria dos Apóstolos nem o sacerdócio ministerial, mostra claramente que a não admissão das mulheres à ordenação sacerdotal não pode significar uma sua menor dignidade nem uma discriminação a seu respeito, mas a observância fiel de uma disposição que se deve atribuir à sabedoria do Senhor do universo.”

João Paulo II, Carta Apóstólica Ordinatio Sacerdotalis

A Igreja exclui as mulheres das posições de maior representatividade. Devemos lutar pelos nossos direitos!

Direitos?!  O sacerdócio não é um direito.  É bom lembrar que um dos principais ensinamentos de Jesus foi o de que devemos estar na Igreja com o desejo de servir, e não de alcançar reconhecimento.

São Francisco de Assis, por exemplo, nunca foi padre, e é uma das personalidades mais relevantes da cristandade. E o que ele foi mesmo? Basicamente, foi um mendigo. E você aí, mulher, toda trabalhada no salto e na chapinha, tá reclamando da vida porque? Quer poder? Vai caçar em outras bandas! Apesar de muita gente praticar o contrário, a Igreja não é lugar pra alpinismo espiritual.

Quem se preocupa com cargos eclesiásticos não está preparado para servir a Cristo. As mulheres devem seguir os passos de Madre Teresa de Calcutá (religiosa) e Zilda Arns (médica, esposa e mãe), que queriam somente amar a Cristo e servir aos irmãos. Quem poderá medir o bem que elas fizeram?

Na Igreja primitiva havia mulheres diaconisas. Então porque não podemos ser diaconisas hoje?

Em uma de suas cartas, São Paulo se refere com muito respeito à diaconisa Febe (I Rom 16, 1). Mas é um equívoco pensar que as diaconisas exerciam funções equivalentes àquelas que os diáconos exercem hoje. Reparem que São Paulo proíbe as mulheres de tomar a palavra nas assembleias da Igreja; assim, as mulheres não podiam fazer homilias ou pregar nas assembleias:

“Que as mulheres fiquem caladas nas assembleias, como se faz em todas as Igrejas dos cristãos, pois não lhes é permitido tomar a palavra.” (1Cor 14: 34s)

O trabalho das diaconisas  era muito próximo ao que as freiras fazem hoje: cuidavam e visitavam os enfermos, socorriam os mais pobres etc. Elas também batizavam outras mulheres, mas esta função foi suprimida com o tempo, já que o batismo de adultos tournou-se mais raro. Porém, as diaconisas jamais exerciam funções sacerdotais ou ligadas ao serviço ao altar, como explica Santo Epifânio (+ 403), em seu célebre Panarion:

“Quanto à categoria das diaconisas, existente na Igreja, não foi destinada a cumprir funções sacerdotais ou outras similares. As diaconisas são chamadas a salvaguardar a decência que se impõem no tocante ao sexo feminino, seja cooperando na administração do sacramento do Batismo, seja examinando as mulheres afetadas por alguma enfermidade ou vítimas de violência, seja intervindo todas as vezes que se trate de descobrir o corpo de outras mulheres a fim de que o desnudamento não seja exposto aos olhares dos homens que executam as santas cerimônias…”

(Panarion LXXIX 3)

A Igreja Católica proíbe a ordenação de sacerdotal de mulheres porque é uma instituição machista”.

Eu faço um desafio a qualquer mulher: vá viver por um ano em uma nação não-cristã – entre comunistas, islâmicos, hinduístas ou índigenas – e depois eu quero ver se você vai continuar com esta cantilena. Dê graças a Deus, mocinha, por ter nascido em um país fortemente influenciado pela cultura cristã. Ao menos 90% do que você chama de liberdade é fruto dessa influência.

Em 2 mil anos de História da Igreja, jamais uma mulher foi ordenada sacerdote (ao menos não de forma válida). E esta restrição não se dá porque a Igreja acha que elas são menos santas, menos inteligentes ou menos capazes do que os homens, mas sim porque é fiel às Escrituras e à Sagrada Tradição herdada dos Apóstolos.

Resumidamente: Ordenação sacerdotal apenas para homens - O Beato João Paulo II explicou muito bem isso, o Papa Emérito Bento XVI também, porque Cristo não colocou nenhuma mulher como sacerdote, nem a sua própria mãe. 

O sacerdócio é uma missão do homem. Isso não é questão de mais dignidade ou de menos dignidade, não. É questão de missão. Para a mulher foi dada a missão de ser Mãe, ser Esposa. Ao homem foi dada missões, entre elas a de ser “alter christus”, um outro Cristo. O filho de Deus, o salvador da humanidade é o homem Jesus Cristo, então os seus ministros Deus quis que fossem os homens. E Deus sabe o por quê, Deus tem as suas razões que superam todo o nosso entendimento, é por isso que o Beato João Paulo II, em um documento sobre a vocação dos sacerdotes, ele coloca bem claro que esta é uma questão que a Igreja militante não tem competência para mudar. 


Perguntaram ao Papa se ele estava falando de uma maneira dogmática, definitiva. E a resposta de João Paulo II foi que sim. E as mulheres precisam entender que não é uma questão de mais ou menos dignidade, não. É um serviço, não é uma honraria. Foi dada a mulher a missão de ser mãe, não ao homem. Deus dá a cada um uma missão. Então, o sacerdote é aquele que abre mão de tudo. Ele deve ser uma pessoa de muita oração, de muita penitência e de muita vigilância para não cair no pecado. É claro que o demônio quer derrubar os sacerdotes, e aquele sacerdote que não rezar muito, que não fizer penitência e que não entregar sua vida 24hs para Deus, esse sacerdote pode ser derrubado pelo pecado. 

Colaborou O Catequista.

sábado, 9 de março de 2013

O caso Galileu

Muito comentado por todos mas conhecido por poucos, o caso Galileu Galilei é um momento importante da "História da Igreja".


Como morreu Galileu?

O primeiro ponto que deveria ficar claro é que a Inquisição não matou a Galileu. Ele morreu de morte natural. Galileu nasceu na terça-feira, 15 de fevereiro de 1564 em Pisa, e morreu na quarta-feira, 8 de janeiro de 1642, em sua casa, uma vila em Arcetri nas imediações de Florença. Portanto quando morreu tinha quase 78 anos (é possível encontrar uma diferença de um ano inclusive em documentos oficiais, porque então, em Florença, os anos começavam a contar em 25 de março, data da Encarnação do Senhor). Conta Vicenzo Viviani, um jovem discípulo de Galileu que permaneceu continuamente junto a ele nos últimos trinta meses, que sua saúde estava muito debilitada: tinha uma grave artrite desde os 30 anos e a isto se unia uma irritação constante e quase insuportável nas pálpebras e outros achaques que traz consigo uma idade tão avançada, sobretudo quando consumida em muito estudo e vigília.

Acrescenta que, apesar de tudo, seguia cheio de projetos de trabalho, até que por fim lhe assaltou uma febre que o foi consumindo lentamente e uma forte palpitação, com a qual ao longo de dois meses foi se extenuando cada vez mais, e por fim, uma quarta-feira, 8 de janeiro de 1642, às quatro horas da manhã, morreu com firmeza filosófica e cristã, aos setenta e sete anos de idade, dez meses e vinte dias. Portanto, não existiu a fogueira nem nada parecido.

Tampouco foi condenado à morte. O único processo em que foi condenado ocorreu em 1633, e ali foi condenado à prisão que em vista de suas boas disposições, foi comutada imediatamente por prisão domiciliar, de modo que nunca chegou a ingressar em um cárcere. durante o processo deveria ter estado na prisão da Inquisição, segundo as normas comuns, mas de fato nunca esteve lá: antes de começar o processo se alojou na embaixada de Toscana em Roma, situada no Palazzo Firenze, onde vivia o embaixador; durante o processo foi exigido em alguns momentos que se alojasse no edifício da Inquisição, mas então lhe habilitaram umas estâncias que estavam reservada para os eclesiásticos que trabalhavam ali, permitindo que lhe levassem comida da embaixada Toscana; e ao acabar o processo foi permitido que estivesse alojado na Vila Médici, uma das melhores vilas de Roma, com esplêndidos jardins, propriedade do Grande Duque de Toscana. Tudo isto se explica porque Galileu era oficialmente o primeiro matemático e filósofo do Grande Duque de Toscana, território importante (inclui Florença, Pisa, Livorno, Siena, etc.) e tradicionalmente bem relacionado com a Santa Sé, e as autoridades de Toscana exerceram bons ofícios para que em Roma Galileu fosse tratado o melhor possível, como de fato sucedeu.



O embaixador de Toscana, Francesco Niccolini, apreciava muitíssimo a Galileu, e colocou todos os meios para que sofresse o menos possível com o processo, e para que não fosse preso. Niccolini conseguiu que, ao fim do processo, a pena de prisão que se impôs fosse comutada por confinamento na Vila Médici. Depois de poucos dias foi permitido que se trasladasse a Siena, onde se alojou no palácio do arcebispo, monsenhor Ascanio Piccolomini; este era um grande admirador e amigo de Galileu, e o tratou esplendidamente durante os vários meses em que esteve em sua casa, de modo que ali se recuperou do trauma que sem dúvida, supôs o processo (em 1633, quando ocorreu o processo, Galileu tinha 69 anos). Depois, foi permitido que se trasladasse à casa que tinha fora de Florença, e ali permaneceu até a morte, já velho, de morte natural. Acabou sua obra mais importante, e a publicou, em 1638, depois do processo.

Definitivamente, Galileu não foi condenado à morte, mas a uma prisão que não chegou a se executar porque foi comutada: primeiro, por uma estância de vários dias na Vila Médici, em Roma; depois, por uma estância de vários meses no palácio de seu amigo arcebispo de Siena; e a continuação (fins de 1633), foi-lhe permitido residir, em uma espécie de prisão domiciliar, em sua própria casa, na Vila do Gioiello, em Arcetri, nas imediações de Florença, onde viveu e trabalhou até sua morte.

Galileu nunca foi submetido a tortura ou a maus tratos físicos. Sem dúvida, fazê-lo ir a Roma vindo de Florença para ser julgado, tendo 69 anos, supõe mau trato, e o mesmo se pode dizer da tensão psicológica que teve de suportar durante o processo e na condenação final, seguida de uma abjuração forçada. É certo. Desde o ponto de vista psicológico, com a repercussão que isto pode ter na saúde, Galileu teve que sofrer por estes motivos e, de fato, quando chegou a Siena depois do processo, se encontrava em más condições. Mas é igualmente certo que não foi nenhum objeto dos maus tratos físicos típicos da época. 

Algum autor afirmou que, durante o processo, ao final, em uma ocasião, foi submetido a tortura; entretanto, autores de todas as tendências estão de acordo, com praticamente unanimidade, que isto realmente não aconteceu. Na fase conclusiva do processo, em uma ocasião, encontra-se uma ameaça de tortura por parte do tribunal, mas todos os dados disponíveis estão a favor de que se tratou de pura formalidade que, devido aos regulamentos da Inquisição, o tribunal devia mencionar, mas sem intenção de levá-la à prática e sem que, de fato, fosse realizada (consta, além disso, que em Roma não se praticava a tortura com pessoas da idade de Galileu). Depois da condenação, em Siena, Galileu se recuperou. Logo sofreu diversas doenças, mas eram as mesmas que já sofria habitualmente desde muitos anos antes e que foram se agravando com a idade. Chegou a ficar completamente cego, mas nada teve a ver com o processo.

Por que Galileu foi condenado?

O que mais chama a atenção não são os maus tratos físicos que como acabamos de ver, não existiram, mas o fato em si mesmo de que Galileu foi condenado, com as tensões e sofrimentos que isto implica. Desde logo, não era homicida, nem ladrão, nem malfeitor em nenhum sentido habitual da palavra. Então, porque foi condenado? Qual foi a condenação?

Costuma-se falar de dois processos contra Galileu: o primeiro em 1616, e o segundo em 1633. Às vezes só se fala do segundo. O motivo é simples: o primeiro processo realmente existiu, porque Galileu foi denunciado à Inquisição romana e o processo foi adiante, mas Galileu não chegou a ser convocado diante do tribunal: o denunciado se inteirou de que existia a denúncia e o processo através de comentários de outras pessoas, mas o tribunal nunca lhe disse nada, nem o convocou, nem o condenou. Por isso com freqüência não se considera que se tratou de um autêntico processo, ainda que de fato a causa se abriu e se desenvolveram algumas diligências processuais durante meses. Ao contrário, o de 1633 foi um processo a toda regra: Galileu foi intimado a comparecer diante do tribunal da Inquisição de Roma, teve que se apresentar e declarar diante desse tribunal, e finalmente foi condenado. Tratam-se de dois processos muito diferentes, separados por muitos anos; mas estão relacionados, porque o que aconteceu no de 1616 condicionou em grande parte o que aconteceu em 1633.

O processo de 1616

Em 1616 Galileu era acusado de postular o sistema heliocêntrico proposto na Antigüidade pelos pitagóricos e na época moderna por Copérnico: afirmava que a Terra não está quieta no centro do mundo, como geralmente se acreditava, mas que gira sobre si mesma e ao redor do Sol, da mesma forma que os outros planetas do Sistema Solar. Isto parecia ir contra textos da Bíblia onde se diz que a Terra está quieta e o Sol se move, de acordo com a experiência; além disso, a Tradição da Igreja assim havia interpretado a Bíblia durante séculos, e o Concílio de Trento havia insistido em que os católicos não deveriam admitir interpretações da Bíblia que se afastassem das interpretações unânimes dos Santos Padres.

Os acontecimentos de 1616 acabaram com dois atos extra-judiciais. Por um lado, publicou-se um decreto da Congregação do Index, datado de 5 de março de 1616, pelo qual se incluíram no índice de livros proibidos três livros: Sobre as revoluções do cônego polaco Nicolau Copérnico, publicado em 1543, onde se expunha a teoria heliocêntrica de modo científico; um comentário do agostiniano espanhol Diego de Zúñiga, publicado em Toledo em 1584 e em Roma em 1591, onde se interpretava alguma passagem da Bíblia de acordo com o copernicanismo; e um opúsculo do carmelita italiano Paolo Foscarini, publicado em 1615, onde defendia-se que o sistema de Copérnico não está contra a Sagrada Escritura. Ficava afetado pelas mesmas censuras qualquer outro livro que ensinasse as mesmas doutrinas. O motivo que se dava no decreto para essas censuras era de que a doutrina que defende que a Terra se move e o Sol está em repouso é falsa e completamente contrária à Sagrada Escritura. Por outro lado, Galileu foi admoestado pessoalmente para que abandonasse a teoria heliocêntrica e se abstivesse de defendê-la.

O opúsculo de Foscarini foi proibido absolutamente. Ao contrário, os livros de Copérnico e de Zúñiga somente foram suspendidos até que se corrigissem algumas passagens. No caso de Zúñiga, o que deveria se modificar era muito breve. No caso de Copérnico tratavam-se de diversas passagens onde deveria explicar que o heliocentrismo não era uma teoria verdadeira, mas só um artifício útil para os cálculos astronômicos. De fato, essas correções foram preparadas e aprovadas ao fim de quatro anos, em 1620.

Podemos nos perguntar por que se dava tanta importância a algo que, hoje em dia, parece simples: quando a Bíblia fala de questões científicas, com freqüência adota o modo de falar próprio da cultura, da época ou simplesmente da experiência ordinária. De fato este foi um dos argumentos que Galileu utilizou em sua Carta a Benedetto Castelli, que circulou em cópias à mão (Castelli era um beneditino, amigo e discípulo de Galileu, professor de matemática na Universidade de Pisa), e com maior extensão em sua Carta à Grande Duquesa de Toscana, Cristina de Lorena (mãe do que naqueles momentos era Grande Duque de Toscana, Cosme II), a quem havia chegado ecos das acusações bíblicas contra Galileu.

Para compreender o fundo do assunto deve-se mencionar três problemas. Em primeiro lugar, Galileu tinha se tornado célebre com seus descobrimentos astronômicos de 1609-1610. Utilizando o telescópio que ele mesmo contribuiu de modo decisivo para aperfeiçoar, descobriu que a Lua possui irregularidades como a Terra, que ao redor de Júpiter giram quatro satélites, que Vênus apresenta fases como a Lua, que na superfície do Sol existem manchas que mudam de lugar, e que existem muito mais estrelas do que as que se vêem a olho nu. Galileu se baseou nestes descobrimentos para criticar a física aristotélica e apoiar o heliocentrismo copernicano. Os professores aristotélicos, que eram muitos e poderosos, sentiam que os argumentos de Galileu contradiziam sua ciência, e às vezes passavam ridículo. Estes professores atacaram seriamente a Galileu e, quando acabavam-se as respostas, alguns recorreram aos argumentos teológicos (a pretendida contradição entre Copérnico e a Bíblia).

Em segundo lugar, a Igreja católica era naqueles momentos especialmente sensível para com aqueles que interpretavam por sua conta a Bíblia, afastando-se da Tradição, porque o enfrentamento com o protestantismo era muito forte. Galileo se defendeu de quem dizia que o heliocentrismo era contrário à Bíblia explicando por que não era, mas com isto se fazia de teólogo, o que era considerado então como algo perigoso, sobretudo quando, como neste caso, se afastava das interpretações tradicionais. Galileu argumentou bem como teólogo, sublinhando que a Bíblia não pretende nos ensinar ciëncia e se acomoda aos conhecimentos de cada momento, e inclusive mostrou que na Tradição da Igreja se encontravam precedentes que permitiam utilizar argumentos como os que ele propunha. Mas, em uma época de fortes polêmicas teológicas entre católicos e protestantes, estava muito mal visto que um profano pretendesse dar lições aos teólogos, propondo algumas novidades um tanto estranhas.

Em terceiro lugar, a cosmovisão tradicional, que colocava a Terra no centro do mundo, parecia estar de acordo com a experiência ordinária: vemos que se movem o Sol, a Lua, os planetas e as estrelas; ao invés, se a Terra se movesse, deveriam suceder coisas que não sucedem: projétéis atirados para cima cairiam atrás, não se sabe como estariam as nuvens unidas à Terra sem ficar também atrás, se deveria notar um movimento tão rápido.

Além disso, essa cosmovisão tradicional parecia muito mais coerente com a perspectiva cristã de um mundo criado para o homem, e também com a Encarnação e a Redenção da humanidade através de Jesus; de fato, entre aqueles que haviam aceitado as idéias de Copérnico contava-se Giordano Bruno, que defendeu que existem muitos mundos habitados e acabou sustentando doutrinas mais ou menos heréticas (Bruno foi queimado, como conseqüência de sua condenação pela Inquisição romana, em 1600, ainda que deve-se sublinhar, não como desculpa mas para maior claridade, que não era propriamente um cientista, ainda que utilizasse o copernicanismo como ponto de partida).

Os acontecimentos de 1616 culminaram em um decreto da Congregação do Índex, datado de 5 de março de 1616, pelo qual foram proibidos os livros mencionados, com os matizes já apontados. O decreto foi publicado em nome da Congregação, e está assinado pelo cardeal prefeito e pelo secretário da Congregação, não pelo Papa. Desde então, um ato desse tipo era feito com o mandato ou aprovação do Papa e, de algum modo, comprometia a autoridade do Papa, mas de nenhuma maneira pode ser considerado como um ato que se põe em jogo a infalibilidade do Papa: por uma parte, porque nem está assinado pelo Papa e nem mesmo a menciona; por outra, porque trata-se de um ato de governo de uma Congregação, não de um ato de magistério; e além disso, porque não pretende definir uma doutrina de modo definitivo. Isso era perfeitamente sabido então, como agora; como prova disso pode-se mencionar uma carta de Benedetto Castelli a Galileu, escrita em 2 de outubro de 1632, quando já tinha sido ordenado a Galileu que comparecesse perante a Inquisição de Roma. Castelli falou com o Padre Comissário do Santo Ofício, Vincenzo Maculano, e defendeu a ortodoxia da posição de Copérnico e de Galileu, acrescentando que várias vezes falou de tudo isso com teólogos piedosos e muito inteligentes, e não viram nenhuma dificuldade; acrescenta que o próprio Maculano lhe disse que concordava e que, em sua opinião, a questão não deveria se resolver recorrendo à Sagrada Escritura. É fácil advertir que estas opiniões, tratadas no próprio Comissário do Santo Ofício, não teriam sentido se o decreto do índex de 1616 pudesse ser interpretado como tendo um alcance de magistério infalível ou definitivo.

Nas deliberações da Santa Sede, prévias ao decreto, foram pedidas as opiniões de onze consultores do Santo Ofício, que relataram, em 24 de fevereiro de 1616, que dizer que o Sol está parado no centro do universo é absurdo em filosofia e além disso formalmente herético, porque contradiz muitos lugares da Escritura tal como expõe os Santos Padres e os teólogos, e dizer que a Terra se move é também um absurdo em filosofia e ao menos errôneo na fé. Com freqüência é tomada esta opinião dos teólogos consultores como se fosse ditame da autoridade da Igreja, mas não é: foi somente a opinião dessas pessoas. O único ato público da autoridade da Igreja foi o decreto da Congregação do Índex, e nesse decreto não é dito que a doutrina heliocêntrica seja herética: é dito que é falsa e que se opõe à Sagrada Escritura. O matiz é importante, e qualquer entendido em teologia o sabia então e o sabe agora. Ninguém considerou, então, nem deveria considerar agora, que o heliocentrismo foi condenado como heresia, porque não é certo. Isto explica que Galileu e outras pessoas igualmente católicas continuaram aceitando o heliocentrismo; Galileu sabia (e estava certo) que ele havia mostrado, em suas cartas a Castelli e a Cristina Lorena, que o heliocentrismo podia ser compatível com a Sagrada Escritura, utilizando princípios que não eram novos, mas que tinham apoio na tradição da Igreja.

A decisão da autoridade da Igreja em 1616 foi equivocada, ainda que não tenha qualificado o heliocentrismo como heresia. Galileu e seus amigos eclesiásticos se propuseram a conseguir que este decreto fosse revogado. Poderiam ter conseguido: trata-se de um decreto disciplinar que ainda que fosse acompanhado por um valor doutrinal, não condenava o heliocentrismo como heresia, nem era um ato de magistério infalível.

Outro aspecto importante a levar em conta é que, ainda que as críticas de Galileu à posição tradicional estavam fundamentadas, nem ele nem ninguém possuíam naqueles momentos argumentos para demonstrar que a Terra se move ao redor do Sol. Esta afirmação parecia mais absurda, tal como a qualificação dos teólogos do Santo Ofício. Em uma famosa carta, o cardeal Roberto Belarmino, um dos teólogos mais influentes então, pedia tanto a Foscarini como a Galileu que utilizassem o heliocentrismo somente como um hipótese astronômica, sem pretender que fosse verdadeira nem entrar em argumentos teológicos, em cujo caso não haveria nenhum problema. Mas Galileu para defender-se de acusações pessoais e para tentar que a Igreja não interviesse no assunto, se lançou a uma defesa forte do copernicanismo, mudando-se para Roma e tentando influenciar nas personalidades eclesiásticas; isto teve talvez um efeito contrário, provocando que a autoridade da Igreja interviesse para frear a propaganda de Galileu que, ao menos em suas críticas, era bastante convincente.

Além do decreto da Congregação do Índex, as autoridades eclesiásticas tomaram outra decisão que afetava pessoalmente a Galileu e que influiu decisivamente em seu processo, 17 anos mais tarde. Em concreto, por ordem do Papa (Paulo V), o cardeal Belarmino citou Galileu (que se encontrava então em Roma, dedicado à propaganda do copernicanismo) e, na residência do cardeal, em 26 de fevereiro de 1616, o admoestou a abandonar a teoria copernicana. O Papa tinha mandado Belarmino a que fizesse essa admoestação, acrescentando que, se Galileu não quisesse abandonar a teoria, o Comissário do Santo Ofício, diante do notário e testemunhas, o ordenasse para que não ensinasse, defendesse nem tratasse essa doutrina, e que se isto fosse negado, o prendesse. Consta que Belarmino fez a admoestação. Mas entre os documentos que foram conservados existe um que deu espaço a discussões sobre a força e o alcance desse preceito: disse que, em continuação à admoestação de Belarmino, o Padre Comissário do Santo Ofício (o dominicano Michelangelo Seghizzi) transmitiu o preceito mencionado; mas esse documento está sem assinar. Foram dadas interpretações de todo tipo; a mais extrema é que tratasse de um documento falsificado deliberadamente em 1616 ou em 1633 para acabar com Galileu; mas isto parece muito pouco provável. Com os documentos que possuímos, é muito difícil saber exatamente como se desenvolveu o encontro com Belarmino e Galileu, mas está claro que Galileu entendeu perfeitamente, que em diante, não poderia argumentar a favor do copernicanismo, e, com efeito, assim o fez durante anos. Precisamente o processo a que foi submetido 17 anos depois, em 1633, foi motivado porque, aparentemente, Galileu desobedeceu a esse preceito.

O processo de 1633

Se o decreto da Congregação do Índex em 1616 foi um equívoco, também o foi proibir Galileu de tratar ou defender o copernicanismo. Galileu o sabia. Entretanto, obedeceu. Sempre foi e quis ser um bom católico. Mas sabia que a proibição de 1616 era baseada em um equívoco e queria solucioná-lo. Inclusive advertia do perigo de escândalo que poderia ocasionar essa proibição no futuro, se chegasse a demonstrar com certeza que a Terra gira ao redor do Sol. Seus amigos concordavam com ele.

Em 1623 coincidiram umas circunstâncias que pareciam favorecer uma revisão das decisões de 1616, ou pelo menos tornar possível que se expusesse ainda que fosse com cuidado, os argumentos a favor do copernicanismo. O fator principal foi a eleição como Papa do cardeal Maffeo Barberini, que adotou o nome de Urbano VIII. Era, há muitos anos, um admirador de Galileu, a quem inclusive havia dedicado uma poesia latina em que louvava seus descobrimentos astronômicos. Além disso, desde o primeiro momento teve em postos muita confiança em vários amigos e partidários de Galileu. Em 1624 Galileu foi a Roma e o Papa o recebeu seis vezes, com grande cordialidade. Mas Galileu comprovou ao sondar sobre o assunto do copernicanismo, que se bem Urbano VIII não o considerava herético (já vimos que nunca foi declarado como tal), o considerava como uma posição doutrinalmente temerária e, além disso, estava convencido de que nunca poderia se demonstrar: dizia que os mesmos efeitos observáveis que se explicam com essa teoria, poderiam ser devidos à outras causas diferentes, pois caso contrário, estaríamos limitando a onipotência de Deus. Tratava-se de um argumento que, aparentemente, tinha muita força, e parecia que quem pretendesse demonstrar que o copernicanismo estava pondo limites à onipotência de Deus.

Apesar de tudo, o humor do novo Papa e a posição estratégica de seus amigos levou Galileu a embarcar em um velho projeto pendente: escrever uma grande obra discutindo o copernicanismo e, desde então, argumentando a seu favor. Simplesmente, a apresentaria como um diálogo entre um partidário do geocentrismo e outro do heliocentrismo, sem deixar resolvida a questão. E acrescentaria o argumento do Papa. Mas o leitor inteligente logo se daria conta de que ele tinha razão.

Além disso, Galileu pensava que dispunha de um argumento novo que demonstrava o movimento da Terra: o argumento das marés. Segundo Galileu, as marés só poderiam ser explicadas supondo o movimento da Terra (e não aceita, como se soasse a astrologia, que se devesse à influência da Lua). Inclusive queria intitular sua obra desse modo, como um tratado sobre as marés, mas o Papa soube que pretendia utilizar este título e, como soava demasiadamente realista (de fato o era), aconselhou colocar outro título que não parecesse uma prova do movimento da Terra (desde então, como sabemos, o argumento das marés estava errado). Galileu mudou o título do livro, que passou a chamar Diálogo em torno dos grandes sistemas do mundo, o ptolomaico e o copernicano. Um título muito acertado devido, em parte, à interferência de um Papa que não queria que se tratasse o movimento da Terra como algo real: mas sem dúvida, essa era a intenção principal de Galileu em sua obra. Galileu estava disposto a conceder tudo o que fosse necessário, com tal de publicar uma obra onde se recorressem os argumentos contra a posição tradicional e a favor do copernicanismo.

Galileu acabou de redigir o Diálogo em 1630, e o levou a Roma para obter a permissão eclesiástica para imprimi-lo. A permissão deveria ser concedida pelo Mestre do Sagrado Palácio, o dominicano Niccolò Riccardi, que não sabia astronomia mas era admirador de Galileu e sempre tinha se mostrado desejoso de ajudá-lo. Agora Riccardi se encontrou em um compromisso. Deu a entender que não haveria problemas, ainda que devesse ajustar uma série de detalhes. Galileu voltou a Florença, a peste causou sérias limitações ao tráfego e correio entre Florença e Roma, e aí começou uma cadeia de equívocos que alargaram a concessão da permissão e deixou Galileu irritado. Ao fim de um ano, Galileu solicitou e obteve a intervenção do Grande Duque de Toscana e de seu embaixador em Roma para obter a permissão. Riccardi, que também era toscano e era parente da esposa do embaixador, foi submetido a uma pressão muito forte. Finalmente concedeu a permissão para que se imprimisse o livro em Florença, mas com uma série de condições que se fazia saber Galileu e o Inquisidor de Florença. Riccardi sabia o que o Papa pensava: que só se poderia tratar o copernicanismo como uma hipótese matemática, não como uma representação da realidade; as condições e advertências que deu se encaminhavam a garantir, que não estava nada claro na obra de Galileu.

Galileu introduziu a mudança, mas, seguramente, nem todas as que tinha introduzido Riccardi e tivesse desejado o Papa. No livro, Simplício, o personagem que defende a posição tradicional de Aristóteles e Ptolomeu, sempre sai perdendo. Simplício foi um dos mais famosos comentadores antigos de Aristóteles, mas na obra de Galileu dava a impressão de que seus argumentos e sua atitude correspondiam muito bem a seu nome. Por outro lado, o argumento favorito do Papa aparecia no final da obra: depois de ter exposto todos os argumentos físicos e filosóficos, Simplício, precisamente Simplício, utilizava esse argumento, e ainda que Salviati, o defensor de Copérnico (e Galileu) o aprovasse, o final é muito breve e forçado. Para maior confusão, uma introdução aprovada por Riccardi, em que se explicava que essa obra não pretendia estabelecer o copernicanismo como teoria verdadeira, apareceu impressa em um tipo diferente do resto da obra, dando a impressão de uma adição postiça.

O diálogo terminou de ser impresso em Florença em 21 de fevereiro de 1632. Galileu enviou em seguida exemplares por todas as partes, também a seus amigos em outros países da Europa. Ainda havia problemas de comunicação com Roma por causa da peste, de modo que os primeiros exemplares não chagaram a Roma até a metade de maio. Um deles foi entregue ao cardeal Francesco Barberini, sobrinho e mão direita do Papa, a quem Galileu havia ajudado há alguns anos, a conseguir o doutorado, e quem considerava, igualmente ao Papa, como um grande amigo.

Em 1632, a maior preocupação do Papa era precisamente o movimento do Sol e da Terra. Estava em pleno desenrolar a Guerra dos Trinta Anos, que começou em 1618 e não terminou até 1648, que enfrentava toda a Europa em duas metades, os católicos e os protestantes. Naquele momento havia problemas muito complexos, porque a França católica se encontrava mais para o lado dos protestantes da Suécia e Alemanha, enfrentada com outras potências católicas, Espanha e o Império. Urbano VIII tinha sido cardeal legado em Paris e tendia a alinhar-se com os franceses, temendo, além disso, uma excessiva prepotência dos espanhóis, e tentando não perder a França. Tratava-se de equilíbrios muito difíceis. Os problemas eram graves. Em 8 de março de 1632, em uma reunião de cardeais com o Papa, o cardeal Gaspar Borgia, protetor da Espanha e embaixador do Rei Católico, acusou abertamente ao Papa de não defender como era preciso a causa Católica. Criou-se uma situação extraordinariamente violenta. Nessas condições, Urbano III via-se especialmente obrigado a evitar qualquer coisa que pudesse ser interpretada como não defender a fé católica de modo suficientemente claro.

Precisamente nestas circunstâncias, a metade de maio, começou a chegar a Roma os primeiros exemplares do Diálogo. Em um primeiro momento não aconteceu nada. Mas em dois meses, à metade de julho, se soube que o Papa estava muito enfadado com o livro, que tentava frear sua difusão, e que iria criar uma comissão para estudá-lo e julgá-lo.

A documentação que possuímos não permite saber o que provocou o enfado e a decisão do Papa. Galileu sempre atribuiu a isto a atuação de seus inimigos (que não eram poucos nem pouco influentes), que teriam informado ao Papa de modo tendencioso, predispondo-o contra. Por exemplo, além de denunciar que o livro defendia o copernicanismo, sendo contra o decreto de 1616, teriam colocado em relevo que um dos três personagens, Simplício, que sempre costumava perder, é quem expõe o argumento preferido do Papa sobre a onipotência de Deus e os limites de nossas explicações. Isto poderia parecer uma provocação deliberada, e parece que foi assim interpretado: vários anos depois, Galileu ainda enviava uma mensagem ao Papa, da sua vila de Arcetri, fazendo-se saber que jamais havia passado por sua mente tal coisa. Além disso, como foi assinalado, as circunstâncias pessoais de Urbano VIII naquele momento eram difíceis, e não podia tolerar que se publicasse um livro, que aparecida com a permissão eclesiástica de Roma e de Florença, em que se defendia uma teoria condenada pela Congregação do Índex em 1616 como falsa e contrária a Sagrada Escritura.

O Papa estabeleceu uma comissão para examinar as acusações contra Galileu e julgou que o assunto devia ser enviado ao Santo Ofício (ou Inquisição romana), de onde foi ordenado a Galileu, que vivia em Florença, que se apresentasse em Roma ante esse tribunal durante o mês de outubro de 1632. Depois de tentativas de prorrogação que duraram vários meses, em 30 de dezembro de 1632, o Papa com a Inquisição deu a conhecer que, se Galileu não se apresentasse em Roma, enviaria alguém que se certificasse de sua saúde e se visse que poderia ir a Roma, o levaria preso. O Papa aconselhou seriamente ao Grande Duque que se abstivesse de intervir, porque o assunto era sério. As autoridades toscanas decidiram aconselhar a Galileu que fosse a Roma. O Embaixador Noccolini, que conhecia bem ao Papa e falava com ele com freqüência, advertia que discutir com o Papa e contrariá-lo era o melhor caminho para arruinar a Galileu. Quando o Papa falava com Niccolini do problema causado por Galileu, em várias ocasiões encheu-se de cólera. Todos advertiram Galileu que era melhor ir a Roma e se mostrasse em todo o momento disposto a obedecer no que dissessem, porque se tomasse outra atitude as conseqüências seriam prejudiciais para ele.

Galileu chegou a Roma no domingo dia 13 de fevereiro de 1633, em um liteira facilitada pelo Grande Duque, depois de esperar na fronteira dos Estados Pontifícios por causa da peste que seguia em Florença. O embaixador de Toscana, Francesco Niccolini, se portou maravilhosamente com Galileu, intervindo continuamente em seu favor ante as autoridades de Roma, de acordo com as instruções do Grande Duque, Conseguiram que Galileu não estivesse no cárcere do Santo Ofício, como exigia a norma. Desde sua chegada à Roma até 12 de abril (dois meses), Galileu viveu no Palácio de Florença, onde se encontrava a embaixada de Toscana e a casa do embaixador. As autoridades o recomendaram que evitasse a vida social, de modo que não saía de casa, mas gozava de um tratamento excepcional por parte do embaixador e de sua esposa. Niccolini pedia ao Papa que o assunto fosse o mais breve possível, mas se alongava porque a Inquisição ainda estava deliberando sobre o modo de atuar. Como se descobriu nos arquivos do Santo Ofício o escrito de 1616 em que proibia Galileu de tratar de qualquer modo o copernicanismo, o processo se centrou completamente em uma única acusação: a desobediência desse preceito em 1616.

Galileu foi chamado a depor no Santo Ofício na terça-feira 12 de abril de 1633. Sua defesa pode nos parecer muito estranha: negou que, no Diálogo, defendesse o copernicanismo. Galileu sabia que o Santo Ofício pediu a opinião de três teólogos a respeito e que, em 17 de abril, os três informes concluíam sem lugar a dúvidas (como de fato assim o era) que Galileu, em seu livro, defendia o copernicanismo; neste caso, os teólogos tinham razão. Isto complicava a situação, pois um acusado que não reconhecia um erro comprovado devia ser tratado muito severamente pelo tribunal. Por outro lado, Galileu se defendeu mostrando uma carta que, a seu pedido, o cardeal Balarmino tinha escrito depois dos acontecimentos de 1616, para que pudesse se defender frente àqueles que o caluniavam; nesse escrito, Belarmino dava fé de que Galileu não teve que abjurar de nada e que simplesmente tinha sido notificada a proibição da Congregação do Índex. Mas isso podia ser interpretado também contra Galileu se fosse mostrado, como era o caso, que em seu livro argumentava a favor da doutrina condenada em 1616. O tribunal centrou-se em matizes da proibição feita a Galileu em 1616, que Galileu dizia não se lembrar, porque tinha conservado o documento de Balarmino e aí não se incluíam esses matizes. Desafortunadamente, Balarmino havia morrido e não podia esclarecer a situação.

Estes dias Galileu seguia no Santo Ofício, ainda que tampouco tivesse estado na prisão. Por deferência com o Grande Duque de Toscana e frente à insistência o embaixador, Galileu foi instalado nas habitações do fiscal da Inquisição, traziam-lhe comidas da embaixada de Toscana, e podia passear. Esteve ali desde a terça-feira 12 de abril até o sábado 30 de abril: 17 dias completos. 

Para desbloquear a situação, o Padre Comissário propôs aos Cardeais do Santo Ofício algo insólito: visitar Galileu em suas estalagens e tentar convencê-lo a reconhecer seu erro. Conseguiu depois de uma longa conversa com Galileu em 27 de abril. No dia seguinte, sem comunicar a ninguém mais, escreveu o que tinha feito e o resultado ao cardeal sobrinho do Papa, que se encontrava nestes dias em Castelgandolfo com o Papa; através dessa carta se vê claramente que esta atuação estava aprovada pelo Papa: desse modo, o tribunal poderia salvar sua honra condenando a Galileu, e logo poderia usar clemência com Galileu deixando-o recluso em sua casa, tal como ( disse o Padre Comissário) sugeriu Vossa Excelência (o cardeal Francesco Barberini).

Com efeito, no sábado 30 de abril Galileu reconheceu perante o tribunal que, ao voltar a ler agora seu livro, que tinha acabado há muito tempo, se dava conta de que, devido não a má fé, mas a vanglória e ao desejo de se mostrar mais engenhoso que o resto dos mortais, tinha exposto os argumentos a favor do copernicanismo com uma força que ele mesmo não acreditava que tivesse. A partir daí, as coisas se desenrolaram como o Comissário tinha previsto. Esse mesmo dia foi permitido a Galileu voltar ao Palácio de Florença, à casa do embaixador. Na terça-feira 10 de maio foi chamado ao Santo Ofício para que apresentasse sua defesa; apresentou o original da carta do cardeal Belarmino, e reiterou que tinha atuado com reta intenção. Continuava fechado no palazzo Firenze; o embaixador conseguiu que lhe permitisse a passear na Vila Médici, e inclusive em Castelgangolfo, porque lhe causava mal não fazer nenhum tipo de exercício. Entretanto, a peste continuava açoitando Florença, em alguma carta o diziam que, no meio de sua desgraça, era uma sorte que não estivesse então em Florença.

Na quinta-feira 16 de junho, a Congregação do Santo Ofício tinha, a cada semana, sua reunião com o Papa. Nesta ocasião celebrou-se no palácio do Quirinal. Estavam presentes 6 dos 10 Cardeais da Inquisição, além do Comissário e do Assessor (nos interrogatórios e, em geral, em todas as sessões que foram mencionadas até agora, não estavam presentes os Cardeais: estavam os oficiais do Santo Ofício que transmitiam as atas à Congregação dos Cardeais, e estes, com o Papa, tomavam as decisões). Esse dia o Papa decidiu que Galileu fosse examinado sobre sua intenção com ameaça de tortura (neste caso tratava-se de uma ameaça puramente formal, já que se sabia de antemão que não se realizaria). Depois, Galileu devia abjurar da suspeita de heresia perante a Congregação em pleno. Seria condenado à prisão ao arbítrio da Congregação, seria proibido que no futuro tratasse de qualquer modo o tema do movimento da Terra, seria proibido o Diálogo. Também seria enviada uma cópia da sentença aos núncios inquisidores, sobretudo ao de Florença, para que a lesse publicamente em uma reunião na qual procuraria que se encontrassem os professores de matemática e filosofia. O Papa comunicou esta decisão ao embaixador Niccolini em 19 de junho. Niccolini pediu clemência, e o Papa, manifestando algo que, como se apontou, estava já decidido de antemão, lhe respondeu que, depois da sentença, voltaria a ver o embaixador para ver como se poderia arrumar para que Galileu não estivesse na prisão. De acordo com o Papa, Niccolini comunicou a Galileu que a causa seria terminada em seguida e o livro proibido sem dizer-lhe nada sobre o que tocava a sua pessoa, para não causar-lhe mais aflição.

Desde a terça-feira 21 de junho até sexta-feira 24 de junho, Galileu esteve de novo no Santo Ofício. Na quarta-feira dia 22, Galileu foi levado ao convento de Santa Maria sopra Minerva; foi lida a sentença (assinada por 7 dos 10 Cardeais do Santo Ofício) e abjurou de sua opinião sobre o movimento da Terra diante da Congregação. Foi, para Galileu, o mais desagradável de todo o processo, porque afetava diretamente a sua pessoa e se desenvolveu um público de modo humilhante. Na quinta-feira o Papa, com a Congregação do Santo Ofício reunida no Quirinal, concedeu a Galileu a prisão fosse comutada por arresto na Vila Médici, aonde se trasladou na sexta-feira dia 24. Na quinta-feira dia 30 foi permitido a Galileu abandonar Roma e trasladar-se a Siena, na Toscana, ao palácio do arcebispo. Galileu deixou Roma na quarta-feira 6 de julho e chegou a Siena no sábado 9 de julho. Tinha acabado o pesadelo romano.

A sentença da Inquisição começa com os nomes dos 10 cardeais da Inquisição, e acaba com as assinaturas de 7 deles. O Papa, junto com a Congregação, decidiu que Galileu fosse condenado e que abjurasse de sua opinião, mas no texto da sentença não aparece em nenhum momento citado o Papa; portanto, esse documento não pode ser considerado como um ato de magistério pontifício, e menos ainda como um ato de magistério infalível nem definitivo. No texto da abjuração se lê - maldigo e detesto os mencionados erros e heresias - ; mas não se trata de uma doutrina definida como heresia pelo magistério da Igreja: no texto da abjuração se diz, como assim é, que essa doutrina foi declarada contrária à Sagrada Escritura, e, como sabemos, esta declaração se fez mediante um decreto da Congregação do Índex, que não constituiu um ato de magistério infalível nem definitivo.

O Arcebispo de Siena, Ascanio Piccolomini, era um antigo discípulo, admirador e grande amigo de Galileu. Tinha se oferecido várias vezes para se alojar em sua casa, tendo em conta, além disso, que estava relativamente perto de Florença e que em Florença ainda existiam vestígios da peste. Em Siena, Galileu foi tratado esplendidamente e se recuperou da tensão dos meses precedentes. A pedido do Grande Duque de Toscana, o Papa, junto com o Santo Ofício, concedeu em 1 de dezembro de 1633 que Galileu pudesse voltar a sua casa nas imediações de Florença, na Vila do Gioiello, contanto que permanecesse como em prisão domiciliar, sem sair daí nem ter uma vida social. Consta que em 17 de dezembro Galileu já estava em sua casa, e ali continuou até sua morte em 1642.

Em Arcetri Galileu continuou trabalhando. Ali acabou seus Discursos e demonstrações em torno de novas ciências, obra que publicou em 1638 na Holanda. Trata-se de sua obra mais importante, onde expõe os fundamentos da nova ciência da mecânica, que se desenvolverá neste século até alcançar 50 anos mais tarde, com os Princípios matemáticos da filosofia natural de Newton, obra publicada em 1687, a formulação que marca o nascimento definitivo da ciência experimental moderna.

PERGUNTAS E INTERPRETAÇÕES

Até aqui tentei expor os dados básicos do processo de Galileu. A partir deste momento me ocuparei da valorização desses dados. Dada a perspectiva que adotei, somente aludirei brevemente a alguns aspectos que considero especialmente interessantes.

Em primeiro lugar, podemos dizer que sabemos o fundamental sobre processo de Galileu? É possível que existam dados importantes desconhecidos? A resposta é que os documentos que se conservam permitem reconstruir quase todos os aspectos do processo com grande segurança. Possuímos os interrogatórios e declarações de Galileu em sua totalidade, assim como as decisões do Papa e da Congregação do Santo Ofício. Neste terreno, não é plausível que apareçam novos documentos que afetem substancialmente o que já sabemos. Seguramente existem buracos, um deles, bastante importante, se refere aos acontecimentos do verão de 1632, desde que o Diálogo chegou a Roma até que o Papa convocasse a congregação de teólogos para decidir o que fazer. Quem e como informou ao Papa? Galileu sempre considerou seu processo como conseqüência das informações tendenciosas de seus inimigos. É possível que existam documentos sobre esses acontecimentos, cujo conhecimento permitiria compreender melhor porque se desenrolaram do modo que o fizeram. Poderíamos saber, talvez, até que ponto as coisas poderiam ter acontecido de outra maneira. De todos os modos, isso não mudaria os fatos já conhecidos, entre os quais se conta que Galileu levou adiante, durante anos, seu programa copernicano, ainda que exteriormente parecesse ter renunciado a ele, e que Urbano VIII ficou muito afetado quando notou que seu admirado amigo estava, na realidade, fazendo um jogo diferente do que ele pensava.

Isto não significa que Galileu mentisse deliberadamente. Mas não há dúvida de que considerou o copernicanismo como uma teoria verdadeira, também depois do processo. Em sua carta a Cristina de Lorena explicou amplamente como se poderia solucionar a aparente contradição entre o copernicanismo e a Bíblia; tinha razão e o sabia: por este motivo podia admitir, com consciência tranqüila, o copernicanismo, inclusive depois das condenações de 1616 e 1633. O mesmo acontecia com seus amigos e com outras pessoas suficientemente informadas. O que nos leva a perguntar por que as autoridades eclesiásticas condenaram uma teoria que, se bem não estava completamente demonstrada naquele momento, podia demonstrar-se e, de fato, recebeu novas confirmações nos anos seguintes.

Para responder a essa pergunta devemos considerar que a ciência experimental moderna, tal como a conhecemos agora, estava nascendo e se encontrava ainda em um estado embrionário. Precisamente foi Galileu um de seus pais fundadores. Mas o Galileu que viam as autoridades era muito diferente do que vemos agora, à luz do desenvolvimento da física durante quase quatro séculos. Galileu havia realizado descobrimentos astronômicos importantes e tinha sido reconhecido. Mas não podia provar o movimento da Terra. A ciência moderna praticamente não existia: as contribuições mais importantes de Galileu a essa ciência foram publicadas, nos Discursos, depois do processo. Os eclesiásticos (Belarmino, Urbano VIII e muitos outros), assim como a maioria dos professores universitários, pensavam que o movimento da Terra era um absurdo, porque contradiz muitas experiências certas e, se existisse, deveria ter conseqüências que de fato não se observavam. Não era fácil levar a sério o copernicanismo. Os teólogos que valorizaram em 1616 o repouso do Sol e o movimento da Terra disseram, em primeiro lugar, que ambos eram absurdos de filosofia e, além disso, pareciam contrários à Bíblia. Belarmino, e outros eclesiásticos, notaram que caso se chegasse a demonstrar o movimento da Terra, uma série de passagens bíblicas deveriam ser interpretadas de modo não literal; sabiam que isso poderia ser feito, mas pensavam que o movimento da Terra nunca seria demonstrado e que era absurdo. Isto não justifica toda sua atuação, mas permite situá-la em seu contexto histórico real e torná-la compreensível.

O processo de Galileu não deve ser entendido como um enfrentamento entre ciência e religião. Galileu sempre se considerou católico e tentou mostrar que o copernicanismo não se opunha à doutrina católica. Por sua vez, os eclesiásticos não se opunham ao progresso da ciência; durante sua viagem a Roma em 1611, foi tributada a Galileu uma grande homenagem pública em um ato celebrado no Colégio Romano dos jesuítas, por suas descobertas astronômicas. O problema é que não consideravam que o movimento da Terra fosse uma verdade científica, e inclusive alguns (entre eles, o Papa Urbano VIII) estavam convencidos de que nunca poderia ser demonstrado.

Os inimigos de Galileu desempenharam, provavelmente, um papel importante para desencadear o processo. O temperamento muito vivo de Galileu não contribuía para apaziguar as numerosas disputas que originou seu trabalho desde 1610. Além disso, ele mesmo procurou inimizades de modo desnecessário, de tal modo que, quando o Diálogo foi publicado em 1632, é fácil imaginar que seus inimigos em Roma puderam apresentar ao Papa as coisas de tal maneira que, tendo em conta as difíceis circunstâncias pelas que atravessava Urbano VIII, este se considerou ofendido por Galileu e viu ser necessário intervir com força. O temperamento de Urbano VIII também desempenhou um papel: tinha um caráter forte e pensou que Galileu tinha traído sua amizade sincera; repetiu várias vezes ao embaixador Niccolini que Galileu havia caçoado dele. Consta que, ao falar deste tema com Niccolini, Urbano VIII se encolerizava. Galileu certamente não pretendeu, de modo algum, caçoar do Papa, mas é provável que os inimigos de Galileu, no verão de 1632, convenceram ao Papa do contrário, e que isto influíra seriamente no desenvolvimento dos acontecimentos.

Não se deve pensar somente em inimigos pessoais de Galileu. O movimento da Terra podia facilmente ser visto como causa de dificuldades importantes para o cristianismo. Se a Terra se transformasse em um planeta a mais, e se existissem muitas mais estrelas das que se vêem a olho nu, não poderia isto ser interpretado na linha de Giordano Bruno, que afirmou que existem muitos mundos como o nosso, com suas estrelas e planetas habitados? Nesse caso, que significado teria a Encarnação e a Redenção de Jesus Cristo? O que aconteceria com a salvação de possíveis seres inteligentes que poderiam viver em outros lugares do universo? São perguntas que, na atualidade, se propõem ainda com mais força do que então, frente à possibilidade, remota mas real, de se chegar a saber que existe vida em outros lugares do universo. Em realidade, não é difícil perceber que a revelação cristã se refere diretamente ao que acontece conosco e, portanto, não há dificuldade em princípio para integrar dentro dela outros seres inteligentes. Além disso, a Igreja ensina que os frutos da Redenção se aplicam também a pessoas que viveram antes da Encarnação, ou que vivem depois dela e não conhecem, sem culpa sua, a verdade do cristianismo. Mas se compreende que estes problemas puderam influir naquele momento. A associação do copernicanismo com Bruno não podia favorecer a Galileu. Pode-se recordar que duas pessoas chaves na condenação do copernicanismo em 1616 foram o Papa Paulo V e o cardeal Belarmino; ambos eram Cardeais da Inquisição quando, em 1600, o processo de Bruno chegou a seu fim, e pode se supor que, ao pensar em copernicanismo, o veriam, por assim dizer, associados aos erros teológicos de Bruno.

O movimento da Terra parecia afetar ao cristianismo desde outro ponto de vista. O Diálogo de Galileu continha críticas muito fortes contra a filosofia de Aristóteles, que se vinha usando, ao menos desde o século XIII, como auxílio para a teologia. Nesta filosofia se admitia, por exemplo, que no mundo existe finalidade, e que as qualidades sensíveis existem objetivamente e são base do conhecimento humano. Estas idéias pareciam se arruinar com a nova filosofia matemática e mecanicista de Galileu. A nova ciência nascia em polêmica com a filosofia natural antiga, e não parecia poder preencher o buraco que esta deixava. Ainda que as críticas de Galileu ao aristotelismo se reduzissem a aspectos concretos da física que, certamente, deviam ser abandonados, parecia que a nova ciência pretendia jogar fora, como se costuma dizer, a criança junto com a banheira. Este problema segue sendo atual. Inclusive pode-se dizer que o progresso científico dos últimos séculos o tornou cada vez mais agudo. São muitas as vozes que pedem um sério esforço para integrar o progresso científico dentro de uma visão mais ampla que inclua as dimensões metafísicas e éticas da vida humana. Neste sentido, os que viam na nova ciência uma fonte de dificuldades não estavam completamente errados. Obviamente, o problema não é a ciência em si mesma, cuja legitimidade seria absurdo duvidar. O progresso científico é ambivalente e o fato de que possa ser mal utilizado mal não significa que deva castigar a ciência simplesmente ressaltando que, no fundo do caso Galileu, encontram-se alguns problemas que são reais, continuam sendo atuais, e ainda esperam uma solução. Qual o alcance do conhecimento científico é um desses problemas.

Consta que houve uma tentativa de denunciar Galileu perante a Santa Sé por sua filosofia atomista, exposta brevemente em sua obra, de 1623, Il Saggiatore, argumentando que Galileu negava a objetividade das qualidades sensíveis (cores, odores, sabores) e que isto contradiz a doutrina do Concílio Trento sobre a Eucaristia, segundo a qual, depois da consagração, encontram-se as espécies sacramentais (acidentes do pão, como por exemplo as qualidades sensíveis) sem seu sujeito natural. Chegou-se a dizer que o motivo mais profundo da acusação contra Galileu em 1632 era este, e que o Papa conseguiu que o processo se centrasse em torno ao movimento da Terra, porque em outro caso as conseqüências teriam sido muito piores. A denúncia mencionada existiu, mas parece exagerada demais centrar aí os problemas de Galileu. Esta questão põe de manifesto, entretanto, que a nova física vinha acompanhada por uma filosofia mecanicista que, em parte, chocava com a filosofia e a teologia geralmente admitidas, e é certo que este problema continuou vivo durante muito tempo e inclusive continua vivo, em parte, na atualidade.

O caso de Galileu não afetou seriamente o progresso da ciência. A semente que Galileu plantou deu fruto imediatamente, também na Itália. Ao cabo de poucas décadas, Newton levou a física moderna até seu nascimento definitivo, e o trabalho de Galileu ficou bem assentado.

Por fim, é interessante assinalar que não existiu nenhum outro caso semelhante ao de Galileu. O caso de Galileu não é um caso entro outros do mesmo tipo. O caso mais semelhante é o do evolucionismo, mas a teoria da evolução, dentro de seu âmbito científico, nunca foi condenada por nenhum organismo da Igreja. Quando se tenta colocar no mesmo nível que o caso de Galileu assuntos como o aborto, a eutanásia, a bioética, etc., deve-se ressaltar que, se bem esses problemas incluem componentes relacionados com a ciência, não são problemas propriamente científicos, mas, no máximo, de aplicação dos conhecimentos científicos. Mas isto exigiria uma reflexão específica que vai além dos objetivos a que me propus.

REFERÊNCIAS : Os dados deste artigo estão retirados, em sua maioria, da Edição Nacional das obras de Galileu, preparada por Antonio Favaro: Le Opere di Galileo Galilei, 20 volumes, reimpressão, G. Barbèra Editore, Firenze 1968. Os documentos do processo se encontram no tomo XIX, pp. 272-421, e também foram editados por Sérgio Pagano: I documenti del processo di Galileo Galilei, Pontifícia Academia Scientiarum, Cidade do Vaticano 1984. 



Por Mariano Artigas, professor de Filosofia da Ciência na Universidade de Navarra (Espanha), co-autor do livro “ Galileo en Roma. Crónica de 500 días” e autor do livro “Filosofia da Natureza”.

Mariano Artigas 
Publicado en Scripta Theologica , 32 (2000), pp. 877-896. 
Atualizado em Janeiro de 2006

Fonte da tradução para o português: http://www.acidigital.com/controversia/galileu.htm


segunda-feira, 4 de março de 2013

Tudo o que você precisa saber sobre a Idolatria

Amigos, hoje vamos falar de um assunto muito importante e causa confusão em muitas pessoas - a idolatria.

(Rá, o deus do sol  do Antigo Egito)

Deus condena terminantemente esta prática. A bíblia expõe aos seus leitores que devemos adorar somente a Deus. Ele é digno de toda adoração. Vamos fazer o que muitos cristão não-católicos fazem para debater este assunto, com a bíblia em mãos vamos até o livro do Êxodo cap. 20 versículos 3 ao 5. Diz assim: "Não tenha outros deuses diante de mim. Não faça para vós ídolos, nenhuma representação daquilo que existe no céu e na terra, ou nas águas que estão debaixo da terra. Não se prostre diante desses deuses, nem sirva a eles, porque eu, Javé seu Deus, sou um Deus ciumento."

Bom, com este pequeno trecho em mãos muitas pessoas (em especial os protestantes) partem para cima dos católicos acusando-os de idolatria. Mas vamos analisar bem o que a bíblia nos diz. Primeiro, entendemos que idolatria quer dizer "adorar ídolos". No antigo testamento podemos observar que os pagãos adoravam outros deuses, faziam imagens para prestar culto a estes deuses. Isso é proibido, e não é uma prática aceita pela Igreja Católica Apostólica Romana. Mas e as imagens? E os santos? Por que ajoelham diante de imagens? Por que prestam culto aos santos? Bem, vamos responder tudo isso e claro, com a ajuda de algumas informações vindas de outros meios.

 
(São Vicente de Paulo foi um sacerdote católico francês, declarado santo pelo Papa Clemente XII em 1737. Um dos santos mais populares no Brasil, é venerado por muitos fiéis em todo o mundo)

Pois bem, os santos na Igreja Católica não são adorados (não são idolatrados, pois não ocupam o lugar de Deus). Eles são venerados. Veja bem, eu disse venerados. Isso é bem diferente da prática de idolatria. A Igreja Católica Apostólica Romana sempre ensinou, com base Bíblica, que "Adorarás o Senhor teu Deus, e só a ele servirás" (Dt 6,13). Não adoramos e nem devemos adorar qualquer coisa ou pessoa além do único e Supremo Deus Trino.

Se um médico erra não podemos culpar a medicina pelo seu erro. Da mesma forma, que se um advogado erra não é culpa da lei. Assim, se infelizmente muitos católicos, por ignorância, exageram no respeito às imagens a culpa não é da doutrina católica; que lembra que desde o Antigo Testamento o próprio Deus ordenou ou permitiu a instituição das imagens que conduziriam a salvação através do Verbo Encarnado, Jesus Cristo, como por exemplo a serpente de bronze (Nm 21,4-9; Sb 16,5-14; Jo3,14-15), a arca da Aliança e os querubins (Ex 25,10-22; 1Rs 6,23-28). 

Os católicos sabem que imagens são simplesmente imagens, não tem poder em si mesmas, pois são somente sinais. Seria uma bobeira ao ir para praia ficar em frente à placa que diz "Praia a 10 km" como se tivesse chegado ao lugar desejado. Sabemos que semelhante a uma placa, as imagens somente indicam a verdadeira pessoa digna de admiração e louvor. Isto não quer dizer que as placas são desnecessárias porque apontam para o lugar certo.

Semelhante a isto é pegarmos uma foto de um ente querido e acharmos que esta foto é o próprio ente querido.

Se eu destruir a foto, evidentemente não destruo a pessoa da foto. Se eu pisar na foto, evidentemente não piso na pessoa representada na foto. Mas, como você se sentiria se pegassem uma foto de um ente querido seu e na sua frente cuspissem nela, a destruísse ou pisassem nela? Certamente não ficaríamos muito felizes.

Porque embora a foto não seja a pessoa, o gesto de destruí-la fere gravemente a nossa dignidade.

Ora, a mesma escritura que em Deuteronômio capitulo 4 proíbe imagens é a mesma escritura que mostra que Moisés, Salomão e outros cunharam ou talharam imagens. Teria Deus enlouquecido? Poderia a Bíblia contradizer-se?

Quando o povo no deserto foi picado por serpentes Deus manda Moisés cunhar um cajado de bronze (portanto uma imagem) com uma serpente e todo o que olhasse para este cajado seria curado. Ora, foi o cajado que curou as pessoas? Não, o cajado de serpente representava ao Senhor Jesus Cristo elevado na Cruz. É Ele que cura as pessoas e não a imagem da serpente.

"Moisés fez, pois, uma serpente de bronze, e fixou-a sobre um poste. Se alguém era mordido por uma serpente e olhava para a serpente de bronze, conservava a vida." (Nm 21,9)

Tanto é que o povo começa adorar a imagem como se ela fosse a responsável pela cura e o Senhor manda Moisés destruí-la:

"Destruiu os lugares altos, quebrou as estelas e cortou os ídolos de pau asserás. Despedaçou a serpente de bronze que Moisés tinha feito, porque os israelitas tinham até então queimado incenso diante dela. (Chamavam-na Nehustã)." (2 Rs 18,4)

Vemos então que o errado é a idolatria e não as imagens. Ou seja, o errado é o ato de idolatrar imagens e não fabricá-las!

"Guardai-vos, pois, de fabricar alguma imagem esculpida representando o que quer que seja, figura de homem ou de mulher, representação de algum animal que vive na terra ou de um pássaro que voa nos céus, ou de um réptil que se arrasta sobre a terra, ou de um peixe que vive nas águas, debaixo da terra. Quando levantares os olhos para o céu, e vires o sol, a lua, as estrelas, e todo o exército dos céus, guarda-te de te prostrar diante deles e de render um culto a esses astros, que o Senhor, teu Deus, deu como partilha a todos os povos que vivem debaixo do céu." (Dt 4,16-20)

Não esqueçamos que, na época, havia o politeísmo, ou seja, a crença em vários deuses. A proibição de Deus se refere ao culto de adoração a alguma imagem que fosse tratada como o próprio Deus. Como, por exemplo, o povo que faz um bezerro de ouro para adorá-lo no deserto como se fosse o próprio Deus.

"Tiraram todos os brincos de ouro que tinham nas orelhas e trouxeram-nos a Aarão, o qual, tomando-os em suas mãos, pôs o ouro em um molde e fez dele um bezerro de metal fundido. Então exclamaram: 'Eis, ó Israel, o teu Deus que te tirou do Egito'." (Ex 32, 3-4)

Veja que Salomão, o homem mais sábio que já existiu e existirá segundo o próprio Deus, também fez imagens de madeira:

"Fez no santuário dois querubins de pau de oliveira, que tinham dez côvados de altura. Cada uma das asas dos querubins tinha cinco côvados, o que fazia dez côvados da extremidade de uma asa à extremidade da outra. Revestiu também de ouro os querubins. Mandou esculpir em relevo em todas as paredes da casa, ao redor, no santuário como no templo, querubins, palmas e flores abertas. Nos dois batentes de pau de oliveira mandou esculpir querubins, palmas e flores desabrochadas, e cobriu-as de ouro; cobriu de ouro tanto os querubins como as palmas." (1 Rs 6,23-32)

O que a Igreja ensina sobre imagens:

"A imagem sacra, representa principalmente Cristo. Ela não pode representar o Deus invisível e incompreensível; é a encarnação do Filho de Deus que inaugurou uma nova economia das imagens: 'Antigamente Deus, que não tem corpo nem aparência, não podia em absoluto ser representado por uma imagem. Mas agora, que se mostrou na carne e viveu com os homens, posso fazer uma imagem daquilo que vi de Deus (...) Com o rosto descoberto, contemplados a glória do Senhor'". (São João Damasceno)

"O culto cristão das imagens não é contrário ao primeiro mandamento que proíbe ídolos. De fato 'a honra prestada a uma imagem é prestada na verdade a pessoa a ela representada'" (São Basílio).

"O culto da religião não se dirige as imagens em si mesmas como realidades, mas as considera em seu aspecto próprio de imagens que nos conduzem ao Deus encarnado. Ora, o movimento que se dirige à imagem, enquanto tal não termina nela, mas tende para a realidade da qual é a imagem." (São Thomás de Aquino). 

 
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A idolatria do ouro 


"Porque tudo o que há no mundo - a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos, e o ORGULHO DA RIQUEZA - NÃO VEM DO PAI, MAS DO MUNDO" (I São João 2,16).

 
(Pastores protestantes se prostraram diante de oferta feita por fiéis em um culto - típica cena de adoração ao ouro, o que para muitos é a solução de problemas e a saída para causas perdidas)

Preste bem atenção no que você vai ler agora. Quem são os verdadeiros idólatras de hoje? O que fazem? 
Bem, a Teologia da prosperidade é uma doutrina protestante. A bíblia diz em Cl 3,5: "Especialmente a ganância que é uma idolatria." Em Ef 5,5 também diz que "O ganancioso que é idólatra." Muitos protestantes que defendem esta teologia tem o costume de associar Deus a bens materiais. A idolatria no evangelho é repreendida por Jesus quanto a adoração ao deus do ouro e da prata (Mamom), pois não se pode servir a dois senhores (Mt 6, 24). 

 
(Igreja protestante brasileira inicia campanha com a venda de tijolinhos de borracha por R$ 200,00. O pastor disse que o dinheiro arrecado servirá "a obra de Deus").

E devemos lembrar que a Teologia da prosperidade não surgiu com os neopentecostais, apenas ficou mais evidente. 


Algumas doutrinas do protestantismo prega a barganha com Deus desde sua origem, como mostra o livro "A ética protestante e o espírito do capitalismo", de Max Weber. Por isso, fiquem atentos sobre a prática de idolatria, e não confundam ADORAR com VENERAR. São duas ações distintas, e a primeira é terminantemente proibida por Deus e pela santa Igreja de Cristo.




 

Texto escrito por Marcelo Petrelli
Colaboração:  Daniel Godri Junior
Fotos: Reprodução internet